37% dos estudantes da UEM poderiam pagar mensalidade
- O Diário do Norte do Paraná
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Cálculo de O Diário leva em conta regras do Prouni e pesquisa socioeconômica da instituição
Direito a ensino gratuito está garantido constitucionalmente, mas há opiniões divergentes
Três de cada dez estudantes da Universidade Estadual de Maringá (UEM)
teriam condições de pagar mensalidade integral ou parcial, se
consideradas as regras do Programa Universidade para Todos (Prouni), do
governo federal, que concede bolsas em faculdades particulares.
Os
pagamentos gerariam um aporte mínimo anual de R$ 58,6 milhões à UEM, o
que representa acréscimo de 14,1% ao orçamento anual da instituição,
bancado atualmente em cerca de 80% pelo governo do Estado. O cálculo
leva em consideração a eventual cobrança aos estudantes de graduação e
pós-graduação que, pela renda, não teriam direito de pleitear os
benefícios do Prouni.
Para se chegar ao valor hipotético a ser
cobrado, O Diário adotou o custo médio das mensalidades dos cursos
presenciais da Unicesumar, de R$ 920, e replicou para os 20 mil
estudantes de graduação e pós-graduação da UEM o perfil socioeconômico
informado pelos 1.458 alunos aprovados no vestibular de inverno de
2013.
Gratuidade
Se considerado apenas o perfil
socioeconômico, 63,1% dos alunos da instituição - que possuem renda
familiar de até 5 salários-mínimos - manteriam o direito de cursar
gratuitamente o ensino superior na UEM. É válido observar que todo este
grupo apresenta renda familiar bruta inferior ao valor da mensalidade
de uma graduação em Medicina oferecida em faculdades particulares de
Maringá.
Em relação ao Prouni, também é importante considerar que
só quem estudou todo o ensino médio em escola pública, ou com bolsa em
escolas privadas, é que pode pleitear benefício integral ou parcial
não reembolsável no ensino superior.
Se adotado também este
critério, o total de estudantes que poderiam ser obrigados a pagar
mensalidade subiria para 51% na UEM. Dentro deste contexto, a
arrecadação possível atingiria R$ 115,4 milhões ao ano – dinheiro
equivalente ao valor apontado como necessário para concluir todas obras
previstas no plano diretor do Hospital Universitário (HU), onde foram
aplicados, em 2012, segundo dados da universidade, cerca de R$ 63
milhões.
Com base no investimento de R$ 355,5 milhões feito pelo
governo do Estado em 2012 na instituição e na distribuição deste valor
por todos os 20 mil estudantes da graduação e pós-graduação, o custo
médio da mensalidade por aluno seria de R$ 1,48 mil, e o custo anual,
de R$ 17,7 mil para cada estudante.
Mais detalhes
Na mesma pesquisa que detalha o
perfil socioeconômico dos candidatos aprovados no vestibular de inverno
2013, 61,3% dos estudantes afirmam ter escolhido a UEM por ser
"pública, gratuita e de qualidade". Outros 9,3% relatam que fizeram a
opção pela universidade por ser "pública e gratuita, satisfazendo as
condições socioeconômicas da família".
Outro aspecto constatado
na avaliação é que 16,7% dos estudantes afirmaram que não teriam que
trabalhar durante a realização do curso, e 43,5% não sabiam se teriam
de trabalhar. Outros 29% afirmaram que teriam de trabalhar, em tempo
parcial ou integral, desde o primeiro ano na universidade.
CUSTOS. UEM; investimento do Estado em 2012 foi de R$ 355 milhões.
—FOTO: JOÃO CLÁUDIO FRAGOSO
ATÉ 1988, MENSALIDADE ERA COBRADA
Desde a fundação, em
1970, quando ocorreu a união da Faculdade de Ciências Econômicas, da
Faculdade de Direito e da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras,
até 1988, quando da aprovação da Constituição Federal, que passou a
garantir no parágrafo quarto do artigo 206 o "ensino gratuito em
instituições oficiais", havia cobrança de mensalidade na Universidade
Estadual de Maringá (UEM). "Quando criada, foi constituída como uma
fundação pública, e havia a determinação legal para arrecadar até um
terço do orçamento", explica o professor doutor do Departamento de
História Reginaldo Dias. Ele lembra que, antes da aprovação da
Constituição, houve um conjunto de lutas envolvendo estudantes,
professores e servidores contra a emissão dos boletos bancários por uma
universidade pública.
Um dos fatos mais marcantes deste período
aconteceu em 1984, quando os alunos, organizados pelo Diretório Central
dos Estudantes (DCE), criado quatro anos antes, ocuparam o prédio da
reitoria para exigir a efetiva gratuidade do ensino superior. O ato
teve grande repercussão em todo o Estado do Paraná, que só garantiu o
acesso gratuito em todas as instituições de ensino superior estaduais
em 1988, quando das alterações na constituição.
Fim da gratuidade
divide opiniões
"O estado tem que assumir a educação, a saúde e a segurança pública. Isto tem que ser uma responsabilidade da federação, dos Estados e dos municípios. Tem coisas que não se pode abrir mão, que são para o bem da sociedade, e a universidade pública tem papel fundamental, pois temos condições de oferecer um ensino de mais qualidade, pela busca e investimentos que são feitos em termos de pesquisa e aperfeiçoamento profissional", considera Marta.
O professor doutor do Deparamento de História da UEM Reginaldo Dias também considera a cobrança um retrocesso. "As universidades públicas pressupõem a concessão de direitos. A cobrança converte o cidadão em consumidor", diz. Outro aspecto negativo, na opinião dele, é que há um pensamento de que a cobrança garante mais recursos às instituições.
"A cobrança tende a ter outra consequência, que é o governo se sentir desobrigado dos repasses. Não é uma conta de soma", observa.
A reitoria da universidade foi procurada, mas a reportagem não conseguiu localizar ninguém que pudesse comentar o assunto em nome da UEM.
No entendimento do coordenador de Ensino Superior do Banco Mundial e professor da Universidade do Arizona (EUA) Francisco Marmolejo, que esteve recentemente no Brasil, as universidades públicas brasileiras deveriam cobrar mensalidades proporcionais à renda dos alunos, para garantir a igualdade de acesso ao ensino superior. "Assim, quem não tem recursos continuaria contando com o ensino superior gratuito", avalia.