Uma década depois da liberação no mercado nacional, as sementes transgênicas dominam quase todas as lavouras de grãos do Paraná. Segundo avaliação do Departamento de Economia Rural (Deral) do estado, cerca de 95% da produção de soja paranaense é geneticamente modificada; em relação ao milho, o índice é ainda maior: a estimativa é de que os grãos com transgenia dominem uma área bem próxima a 100% das plantações estaduais.
No entanto, mesmo com o domínio no campo paranaense, a agricultora transgênica ainda gera discussões sobre os efeitos colaterais que a prática causa. Argumentos não faltam: além da discussão interniminável sobre os malefícios à saúde humana, agora também se discute o uso indiscriminado de agrotóxicos, o que gera mais gastos e consequências para o solo a médio e longo prazo. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), o Brasil passou a ser o maior produtor e comprador de defensivos agrícolas, muito impulsionado pelas culturas com genética alterada.
Impelido pela polêmica, o procurador federal Anselmo Cordeiro Lopes, do Distrito Federal, enviou, em outubro, um ofício à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança para incluir audiências públicas nos processos de análise para a liberação do uso comercial dos transgênicos.
O coordenador do Núcleo de Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável da Universidade Estadual de Maringá (UEM), José Ozinaldo Alves de Sena, garante que as sementes modificadas causam doenças graves ao ser humano. Para ele, o consumidor tem de lutar contra esse tipo de tecnologia.
"O consumidor tem de dizer 'Não quero mais, não vou comprar nada transgênico'. Estamos sendo ignorantes demais. As consequências são muitas e estão bem comprovadas cientificamente. É claro que os prejuízos não surgem de repente, sempre a curto prazo. Tecnologias desse tipo têm impacto a curto, médio e, principalmente, a longo prazo. Quanto às doenças ao homem, já sabemos que os transgênicos geram alergias, esterilidade, alteração na formação de órgãos, doenças hematológicas e cânceres, por exemplo", relata.
Para Sena, o domínio repentino dos transgênicos nas lavouras do Paraná é bastante perigoso. "Não houve precaução alguma. Mesmo quem defende os transgênicos, diz que não há nada comprovado. Como se muda tudo, de uma vez? Quando você não sabe os riscos a curto prazo é preciso, no mínimo, precaução, não?", indaga.
O professor critica os interesses econômicos internacionais e o governo federal. Segundo ele, há a imposição, por parte deles, de que a cultura dos transgênicos é a única possível hoje em dia.
"Os agricultores são marionetes. Não conseguem fugir do sistema, precisam seguir a maré. O problema é que essa prática foge a um limite do que é natural. Está se mexendo em uma unidade, o gene, esquecendo que isso altera o todo. É um segmento estranho à planta. A alteração do gene continua, mesmo depois do consumo humano. Onde é que isso vai parar? Ninguém sabe. Preocupa, preocupa muito", inquieta-se Sena, referindo-se à situação atual dos transgênicos no estado.
Cooperativas e governo exaltam potencial econômico dos transgênicos
O engenheiro agrônomo Rafael Furlanetto, da Cocamar Cooperativa
Agroindustrial, afirma que a tecnologia dos transgênicos são um
importante avanço na agricultura brasileira. Para ele, porém, é preciso
que as mudanças nos genes sejam feitas de forma controlada para um bom
resultado.
"A tecnologia é importantíssima e faz muito bem para a agricultura. Com os transgênicos, as produções rurais cresceram vertiginosamente, o que se reflete na economia do estado e, claro, do país. O uso, porém, muitas vezes é inadequado. É preciso dividir áreas de transgênicos e sementes convencionais e alternar as modificações genéticas. Se não se faz, as pragas se tornam resistentes aos defensivos e as consequências podem ser grandes", explica o engenheiro agrônomo Rafael Furnanetto, da Cocamar Cooperativa Agroindustrial, de Maringá, no norte do Paraná.
O engenheiro ressalta que o maior uso de agrotóxicos, no entanto, não gera malefícios ao produto final e, por consequência, ao consumidor. "Se usado corretamente, não tem risco algum. O que pode gerar problemas é o uso de forma incorreta. As lavouras de milho, por exemplo, devem ter de 5% a 10% de área com sementes convencionais para que os grãos não criem resistência aos defensivos. Porém, não é o que acontece na maioria das plantações. Essa prática dá muito mais trabalho e, por comodidade, os produtores acabam não fazendo".
dizem especialistas (Foto: Cocamar/Divulgação)
As variedades de sementes transgênicas também têm crescido no estado, afirma o diretor do Deral, Francisco Carlos Simione. Com isso, a produtividade das terras paranaenses também aumenta.
Simione afirma que produtores que ainda insistem nas sementes convencionais têm prejuízo. "Até tem procura por grãos convencionais, mas pagam bem menos por isso. Se o custo é praticamente igual, não tem por que apostar nesse tipo de de cultura", diz.
Com relação ao aumento no uso de agrotóxico, o diretor do Deral garante que é um problema que pode ser controlado. "Ainda não é possivel dizer se isso cria problemas reais para as produções. É questão de consciência ambiental. Se o produtor usar corretamente, acredito que não há dano nenhum".
Produtor diz que usar sementes convencionais é ignorância
O agricultor de Maringá Marco Bruschi Neto, de 69 anos, é produtor há
quase 50 anos e mantém todos os seus 600 hectares com sementes
transgênicas de soja e milho. Para ele, a tecnologia genética só trouxe
benefícios ao campo.
"Tudo mudou depois dessa tecnologia. A produção é bem maior. Desde que foi liberado [em 2003], eu só planto transgênico. Usar sementes convencionais, hoje, é ignorância, falta de conhecimento. Não há vantagem nenhuma", comenta o produtor.
Neto compara a época em que começou a plantar, na década de 1950, e a agricultura atual do Paraná. "Queria ter nascido agora, nesta geração de tecnologia. Hoje em dia, é tudo mais fácil. Tem tecnologia para tudo. O produtor tem que aprender que o mundo muda, e muda muito rápido. Se não nos adequarmos, morreremos de fome e, junto conosco, mataremos todos os consumidores também".