Sidnei J. Munhoz é
professor de História Contemporânea na Universidade Estadual de
Maringá. Ele liderou um esforço para expandir o acesso a documentos do
Departamento de Estado dos EUA no Brasil, coordenando um projeto para
digitalizar cópias microfilmadas de documentos produzidos entre 1908 e
1939 e 1945-1959 em colaboração com o Arquivo Nacional do Brasil. Sidnei
atualmente coordena o Programa de Pós-Graduação em História e do
Laboratório de Estudos do Tempo Presente da Universidade Estadual de
Maringá. Sidnei também foi professor do Programa de Pós-Graduação em
História Comparada da Universidade Federal do Rio de Janeiro de 2004 a
2013. Ao longo dos últimos dez anos, a sua investigação tem incidido
sobre as origens da Guerra Fria e as relações entre o Brasil e os EUA
nos primeiros anos da Guerra Fria. Ele organizou, escreveu e co-escreveu
vários livros, incluindo Relações Brasil-EUA, que foi traduzido para o
Inglês e lançado em 2013 no Frankfurt International Book Fair.
Na conversa abaixo, ele discutiu o projeto, o seu significado para o Brasil, e outros assuntos relacionados.
Como originou a ideia para fazer este projeto?
A ideia foi do Jimmy (James Green). Ele me ligou em novembro de 2012 e me contou que havia pensado em digitalizar os documentos produzidos pela diplomacia estadunidense sobre o Brasil no período do Golpe de 1964 e nos chamados anos de chumbo da ditadura implantada pelo o movimento golpista. Jimmy me disse que havia conversado com Marco Aurélio Santana (Projeto Memórias Reveladas). Informou que Marco Aurélio havia sugerido um contato comigo, pois sabia que eu havia digitalizado a partir dos microfilmes produzidos pelo Nara um vasto acervo documental sobre as relações entre o Brasil e os EUA, relativo a períodos anteriores (1908-1940 e 1945-1959). Jimmy e eu nos conhecíamos desde a Brasa de Atlanta (2002). Ele havia publicado um capítulo “Opondo-se à ditadura nos Estados Unidos: direitos humanos e a organização dos Estados Americanos” no livro “Relações Brasil-Estados Unidos: séculos XX e XXI” (2011), organizado por Francisco Carlos Teixeira da Silva e por mim (o livro foi traduzido para o inglês e foi lançado na Frankfurt International Book Fair em 2013. De pronto aceitei participar dessa empreitada, pois acalentava já havia anos a ideia completar os acervos digitais já existentes na CDO (Central de Documentação) da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Essa proximidade e confiança foi muito importante, pois em poucos dias nos pusemos a trabalhar e a buscar o financiamento do projeto. Em alguns dias dei o retorno ao Jimmy com a informação de que o pró-reitor de pesquisa e pós graduação da UEM, professor Mauro Ravagnani havia confirmado que a UEM financiaria grande parte do projeto. Com essa boa notícia, a velocidade do trabalho se intensificou. Nem tudo foi uma maravilha, pois as diferenças burocráticas e de legislação entre os dois países tomaram muito do nosso tempo e criaram muitas dificuldades para firmarmos um acordo de cooperação entre a Brown e a UEM. Por vezes essas dificuldades pareciam insuperáveis. De fato, somente conseguimos fechar o acordo na semana em que Priscila Borba da Costa, Antonio Bianchet Jr e eu viajamos do Brasil para os EUA.
Qual é sua função no projeto?
Sou um dos coordenadores junto com James Green, mas, de fato, Jimmy gerencia a maior parte do projeto. Como vocês sabem, a minha presença aí em Washington, foi apenas no período de implantação do projeto e definição dos primeiros passos da equipe. Continuo a acompanhar tudo daqui do Brasil, mas a experiência de estar aí é de vocês.
Que significa este projeto para você pessoalmente? Que significa para a historia? E para o Brasil?
Esse projeto possibilitará a digitalização e a disponibilização da documentação produzida pela diplomacia dos EUA sobre o Brasil em um período muito importante da história do país. Por meio do projeto ainda será possível solicitar a desclassificação de documentos que ainda continuam secretos e que poderão ser importantes para esclarecer certos aspectos da história do período. Dessa forma, por intermédio deste projeto, será possível disponibilizar aos pesquisadores de todo o mundo documentos importantes das relações entre o Brasil e os EUA e isso certamente terá repercussões nos estudos da história das relações entre os dois países e da história da ditadura implantada pelo golpe de 1964. Para mim, essa é uma oportunidade de contribuir com o avanço dos estudos históricos sobre as relações entre os dois maiores
países do continente e de aprimorar a compreensão do período ditatorial brasileiro. Em adição, o projeto será de inestimável valia para a formação de jovens pesquisadores dos dois países. Acrescento ainda que além da oportunidade de desenvolver um trabalho científico esses jovens poderão dar uma contribuição social relevante ao Brasil, uma vez que cada um deles preparará um dossiê sobre um tema específico que será encaminhado à Comissão Nacional da Verdade (comissão criada pela presidenta Dilma Roussef com vistas a investigar os crimes cometidos durante o período ditatorial).
Qual é seu interesse primário como professor?
Nos últimos quinze anos tenho me dedicado ao estudo da Guerra Fria (historiografia da Guerra Fria, política externa dos EUA e as relações entre o Brasil e os EUA). Dessa forma, o presente projeto se enquadra nos meus interesses de pesquisa. Regra geral ministro disciplinas voltadas à História do Tempo Presente ou relacionadas ao estudo de historiografia e de teorias da história.
Você esteve envolvido em projetos similares? Que foi diferente ou similar?
Coordeno a CDO (Central de Documentação) da UEM. Tenho gerenciado projetos com vistas a dotar a Central de recursos para a digitalização de documentos. Na CDO temos digitalizados acervos documentais importantes para a História do Paraná, do Brasil e das relações Brasil-Estados Unidos. No entanto, o “Opening the Archives” é muito diferente pois implica o envolvimento conjunto de um grupo de estudantes de duas universidades, de dois países diferentes. Além disso, a experiência de trabalhar no Nara, certamente, é singular. Acrescento que o projeto é de grande valia para oferecer aos pesquisadores documentos que permitirão uma melhor compreensão da história do Brasil durante o período ditatorial e, em paralelo, das relações entre o Brasil e os EUA.
O que você espera que os estudantes aprendam com essa experiência?
Para @s estudantes brasileir@s a experiência internacional, de trabalhar no National Archives alavancará as suas carreiras. Priscila estuda história dos EUA e Antonio a história do Golpe de 1964. Assim ambos se beneficiarão muito do projeto. Para @s estudantes da Brown, acredito que é uma possibilidade ímpar para conhecer de perto a documentação dos EUA sobre o período ditatorial brasileiro. Com isso, conhecerão muito mais sobre a história do país e da sua cultura. Além disso, poderão contribuir com a Comissão Nacional da Verdade, ato que se reveste de grande importância social e que certamente marcará as suas experiências acadêmicas. Por fim, será uma experiência de aproximação e solidariedade entre estudantes de ambos os países.
Como antevê o futuro deste projeto? Como evoluirá depois deste verão?
Acredito que poderemos dar continuidade à digitalização de documentos de períodos mais recentes da história das relações entre os dois países. Além disso, com o processo de indexação será possível utilizar ferramentas de busca para pesquisar a documentação na Internet. Como resultado, certamente, haverá um grande avanço nos estudos históricos sobre o período. Além disso, o Interesse do Nara no projeto abre as portas para novas parcerias.
Tem alguma coisa que você deseja acrescentar?
Espero que tudo continue a correr tão bem como está a acontecer até o momento e espero levar outro grupo de estudantes brasileiros para Washington em 2014. Desejo que os estudantes da Brown adquiram ainda um maior interesse pelo Brasil e pela sua história e me coloco à disposição caso decidam passar algum tempo na UEM. Por fim, reafirmo que tem sido muito boa essa parceria. Trabalhar com Jimmy e com toda a equipe realmente tem sido uma experiência ímpar.
http://library.brown.edu/openingthearchives/?page_id=240