Liga Ambiental alega que terras indígenas serão alagadas sem demarcação contínua, como determina a Constituição
A Organização Não-Governamental (ONG) Liga Ambiental protocolou ontem, na
Justiça Federal em Curitiba, uma ação civil pública contra União, Fundação
Nacional do Índio (Funai) e Consórcio Cruzeiro do Sul (Copel e Eletrosul), para
que suspendam a construção da Usina Hidrelétrica Mauá, entre Telêmaco Borba e
Ortigueira, no Rio Tibagi.
O pedido, segundo a ONG, baseia-se em
levantamento histórico de especialistas e materiais arqueológicos que comprovam
que terras indígenas serão alagadas sem que a demarcação contínua tenha
existido, como determina a Constituição Federal. Os estudos são dos professores
Cecília Maria Vieira Helm, antropóloga do Lactec (contratado pelo Consórcio),
Kimiye Tommasino, cientista social pesquisadora do Laboratório de Arqueologia,
Etnologia e Etno-história da Universidade Estadual de Maringá (UEM) e Lúcio
Tadeu Mota, sociólogo, professor da UEM, coordenador do Programa
Interdisciplinar de Estudos de Populações.
De acordo com as pesquisas,
as bacias hidrográficas dos rios Tibagi, Ivaí, Cinzas e Laranjinha abrigam
populações humanas há mais de 10 mil anos. Os dados antropológicos confirmam a
presença indígena nessas bacias hidrográficas caracterizando-as como Terras
Tradicionais das etnias Kaingang, Guarani e Xetá, que ali viveram e ainda
sobrevivem até hoje. Segundo a ONG, mesmo após manobras do governo do Paraná,
que em 1949 reduziu em quase dois terços as terras indígenas, os Kaingang e
Guarani continuaram a ocupá-las de fato até os dias atuais. ''Só a Reserva do
Apucaraninha reduziu de 60 mil para 6 mil hectares nos últimos 20 anos. O receio
é que daqui a alguns anos não exista mais terra suficiente para comportar a
comunidade indígena'', ressaltou o presidente do Conselho Indígena do Paraná,
Ivan Bribis Rodrigues.
A ONG argumenta que nessas áreas, e em especial
às margens do rio Barra Grande (afluente da margem esquerda do Tibagi),
encontram-se não só áreas utilizadas efetivamente pelos índios como também
resquícios arqueológicos que demonstram a sua posse histórica e tradicional
dessas áreas. Segundo a ONG, com base nos achados arqueológicos recentes,
durante a construção, os especialistas atestam que o local onde se pretende
erguer o muro da barragem é terra indígena. A Liga Ambiental solicita que a
Justiça determine a paralisação da obra até que o Congresso autorize, como diz a
Constituição, nos casos em que há aproveitamento energético em terras de povos
nativos.
A assessoria de imprensa do Consórcio Cruzeiro do Sul,
responsável pela construção da usina, informou que se pronunciará somente após a
notificação. A FOLHA não conseguiu contato com a Funai até o fechamento desta
edição. Alvo de protestos de ambientalistas, ribeirinhos, indígenas,
pesquisadores e estudantes, as obras de construção da usina chegaram a ser
suspensas no início de fevereiro, mas foram retomadas no mês seguinte por uma
determinação do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4Região, com sede em Porto
Alegre.
A Usina Hidrelétrica de Mauá terá capacidade de geração de 361
MW, suficiente para atender 1 milhão de pessoas.