O economista Antônio Zotarelli coordena
um curso de Educação Financeira na UEM. As inscrições são gratuitas e
podem ser feitas na Diretoria de Assuntos Comunitários. Mais
informações pelo telefone 3011 4264.
"Gastos conscientes levam a uma economia de 10% a 20%"
De cada cem famílias paranaenses, 86 têm dívidas e 26% delas estão
com as contas atrasadas. E um porcentual mais baixo, de 10%, não têm
dinheiro para quitar os compromissos. O cartão de crédito é o maior
vilão do orçamento das famílias. E uma de cada cinco famílias
endividadas está em situação crítica e já comprometeu boa parte da renda
com boletos. As informações são de uma pesquisa da Federação do
Comércio do Paraná (Fecomércio-PR) referentes a novembro.
O
depósito do 13º salário é uma boa chance de tirar o nome da lista dos
devedores. Pelo menos essa é a sugestão de economistas. A teoria é boa, o
difícil é levar para a prática. O economista Antônio Zotarelli,
professor da Universidade Estadual de Maringá (UEM), diz que um dos
erros mais comuns dos endividados é manter o ritmo de gastos e, com
isso, gerar mais dívidas. A regra número um para quem está com a conta
no vermelho é cortar gastos para quitar os boletos. "Se estou com as
contas apertadas ou endividado, não posso entrar no embalo, me
endividando mais", afirma. "Às vezes, decisões de gastos conscientes nos
levam a uma economia entre 10% e 20%."
P - O que senhor diria para as pessoas que ainda vão receber a segunda parcela do 13º salário?
R
- Depende da situação financeira da pessoa que está com a segunda
parcela do 13º disponível. Se ela estiver com as contas equilibradas,
esse valor deve ir para a poupança ou outro investimento. Se estiver com
dívidas, sem dúvida, esse dinheiro extra deve ser direcionado para a
liquidação ou amortização dessas dívidas. A pessoa pode ter certeza de
que liquidando total ou parcialmente suas dívidas ela estará fazendo um
excelente investimento.
P - Como controlar os gastos de fim de ano já prevendo a chegada das contas de janeiro?
R
- Nós, brasileiros, temos em mente que o fim de ano sempre vem
acompanhado de uma série de gastos extras. Mas isso está em nossa
contabilidade mental. Não é uma verdade para todos, mas, sim, uma
cultura introduzida pela área de marketing. Criam-se necessidades em
função das datas comemorativas. Por que temos a obrigação de dar
presentes no Natal? Se meu projeto de vida de longo prazo for mais
importante ou se minha condição financeira não permite realizar esses
gastos, tenho que encontrar alternativas que tragam a mesma satisfação
de dar presentes comprados. Se o fato de dar presentes me traz uma
grande satisfação e eu posso dar esses presentes natalinos, tudo bem,
mas o contrário, se estou com as contas apertadas ou muito endividado,
racionalmente, não posso entrar nesse embalo me endividando ainda mais.
P - Quais despesas devemos cortar quando estamos no vermelho?
R - É
difícil responder essa pergunta, pois cada caso é um caso. Cada pessoa
tem um nível de necessidade. Quando estamos iniciando nossa vida de
casado e montando o lar, quase todas as despesas são necessárias.
Então, às vezes, deixamos de fazer despesas de consumo para adquirir
bens duráveis. Mas, se estamos no vermelho, precisamos analisar e
avaliar cada item que compõe nossos gastos e chegar à decisão de quais
podem ser cortados desde que não comprometam a qualidade de vida. Às
vezes, decisões de gastos conscientes nos levam a uma economia entre 10%
e 20%. É o que recomendamos no curso de Educação Financeira da UEM. Se
a pessoa fizer duas pesquisas de preços da sua cesta básica e comprar
os itens mais baratos em cada lugar ela estará economizando cerca de
20% do total. Tudo isso adquirindo os mesmos itens com a mesma marca e
qualidade. Então, sempre devemos cortar aqueles itens que julgamos
supérfluos, que se os eliminarmos de nossa vida ou espaçarmos seu
consumo não vão afetar a minha qualidade de vida. Por exemplo: se tomo
seis cervejas toda semana, posso cortar 30% ou 50%, passando a tomar
quatro ou três cervejas. Cada cerveja não consumida semanalmente,
multiplicada por quatro semanas por mês, multiplicada por 52 semanas por
ano, multiplicado pelo custo médio de uma cerveja, aí tenho a real
dimensão financeira do quanto estou gastando de forma supérflua. Assim,
podemos extrapolar esse raciocínio para outros itens.
P - Qual a melhor saída pra se livrar do endividamento? Fazer empréstimo, vender um bem?
R
- A melhor saída é ir honrando a dívida. Em seguida, fazer uma análise
dessa dívida, principalmente no seu custo. Qual a taxa de juros
envolvida nesse endividamento. Em seguida, verificar no mercado as
possibilidades de tomar novo empréstimo e a que taxa de juros e fazer a
comparação. Novo empréstimo para liquidar divida velha só se a taxa de
juros do novo empréstimo for menor que a taxa de juros da dívida
antiga. Nessa condição, vale a pena fazer uma dívida mais barata para
liquidar uma dívida mais cara. Mas cuidado para não fazer uma nova
dívida com valor maior do que a dívida a ser liquidada. Quero dizer
assumir uma divida maior com a finalidade de pagar a dívida antiga e
sobrar dinheiro para consumo. Caso o endividado tenha bens que possam
ser desfeitos a preço de mercado, também é uma boa saída para ajustar
seu orçamento. Mas precisa-se ter bom senso para não se desfazer de um
bem que depois possa fazer falta. Um exemplo é um veículo que serve
como instrumento de trabalho. Se ele se desfaz dele pode ter desempenho
e produtividade no trabalho prejudicados.
P - Como educar um filho para que ele dê mais valor ao dinheiro?
R
- Com diálogo, sempre. Desde pequenos, devemos ir apresentando aos
filhos os conceitos de dinheiro, principalmente aqueles conceitos
ligados ao "ganhar, gastar, poupar, investir e doar". Esses conceitos,
além dos conceitos básicos de juros, que é o custo do dinheiro, devem
ser bem trabalhados com a criança.
P - Qual é o porcentual mínimo que se deve poupar do salário?
R -
Pelo menos 10%. É preciso formar patrimônio. Se não fizermos isso, o
tempo vai passar e vamos nos sentir culpados. Tem muita gente com bons
empregos e bons salários que acaba nem tendo casa para morar. Ao passo
que tem gente que você nunca acharia que teria condição de ter imóvel,
mas tem.
P - Quem está se endividando mais : os ricos ou os pobres?
R -
Existem pessoas com dívidas altas em todos os níveis econômicos. Desde
quem recebe salário mínimo aos altos executivos. A relação com o
dinheiro está muito relacionada à crença. Alguns têm crença desde
criança de que o dinheiro causa desagregação familiar. Veja o caso de
uma herança. O avô morre e a família briga por causa do dinheiro. Tem
gente que cresce com a ideia de que dinheiro não salva, é sujo e
desagrega.
P - É preciso abrir mão de viagens e compras para conseguir construir patrimônio?
R
- Não é preciso abrir mão de muita coisa. Basta ter disciplina. É como
a economia que se faz quando se pesquisa preços de alimentos da cesta
básica. Ela deixou de se alimentar? Não. É a mesma cesta e que, pela
comodidade de comprar em um só lugar, ela acaba gastando 20% mais.
P - O que mais leva ao endividamento: são as pequenas ou as grandes quantias?
R
- São as pequenas dívidas. Uma pessoa compra um produto e faz
prestação. Vai pagar 24 vezes de R$ 50. Depois de dois ou três meses,
ela decide fazer outra prestação também pequena e assume outra dívida.
Se acontece um imprevisto e tem que fazer um gasto em saúde, por
exemplo, ela se desorienta.
P - Pesquisa da Fecomércio no Paraná mostra que, entre os
endividados, a maioria deve no cartão de crédito. Por que as pessoas se
enrolam tanto com o cartão?
R - O cartão é indicado para pessoas
disciplinadas. Se tiver disciplina, o cartão tem seu lado positivo,
como o sistema de pontos. Mas ela sempre tem que pagar a fatura total, e
nunca o valor mínimo. Quem tem dívida com o cartão tem que eliminá-lo
da sua vida e liquidar o saldo devedor junto à administradora.
P - Como funciona o curso de economia doméstica?
R - Nós
coordenamos o projeto de extensão: Educação financeira sustentável" na
UEM. Objetiva atender a comunidade interna (servidores e alunos) e
comunidade externa. Esse projeto oferece cursos de 15 horas de duração
em cinco aulas de três horas cada. Nele são apresentados os conceitos
envolvendo o modelo financeiro que cada um de nós temos, trabalhamos o
projeto de vida, orçamento familiar e noções de investimento e também
orientação pessoal àqueles que procurarem junto à secretaria do
projeto. A mulher procura mais o curso não por ser mais endividada que o
homem. O homem é mais orgulhoso e não reconhece fácil que perdeu o
controle.
http://www.odiario.com/economia/noticia/791822/antonio-zotarelli/