No Brasil, vários Estados já adotaram a meritocracia como critério para pagamento de bônus para professores da rede pública. Por esse critério, terão direito aos bônus os professores que conseguirem reduzir a evasão, a repetência ou que seus alunos obtenham maiores notas em avaliações educacionais.
O governo paranaense ainda não fala em pagamento de bônus por desempenho, mas pretende adotar um regime de metas para o magistério. E, talvez esse seja o primeiro passo na direção da adoção do mecanismo da meritocracia.
O termo meritocracia adquiriu importância na passagem da Idade Média para a Moderna, na gênese do capitalismo, quando a burguesia criticava os privilégios hereditários e nobiliárquicos da nobreza. Os burgueses defendiam a tese da igualdade de oportunidades, sendo que as diferenças entre os indivíduos seriam estabelecidas a partir dos talentos.
No campo educacional afirmava-se a tese de que a escola poderia mudar a sociedade diminuindo as desigualdades sociais.
Mas, todas essas promessas desmoronaram com a crise da globalização e dos ajustes neoliberais do final dos anos noventa.
O capitalismo tem se revelado extremamente desigual nas oportunidades e perverso na distribuição de riquezas. Consequentemente, no contexto atual o discurso da meritocracia é ideológico, porquanto representa a visão de mundo burguesa e porque apenas legitima as diferenças sociais.
No campo da educação só podemos entender a aplicação do critério da meritocracia no conjunto das reformas que vem impactando a educação desde os anos 90.
As reformas visam submeter a escola à lógica do mercado e suprimir a proteção do Estado, retirando da educação o seu caráter de direito social e atribuindo à escola o papel de empresa, desprotegendo os trabalhadores e colocando-os livremente para concorrer no mercado, lutando por um bônus.
O Estado se desresponsabiliza da educação, deixando de criar melhores condições de trabalho para os educadores, diminuindo os investimentos na educação e atribuindo o sucesso e o fracasso da escola aos professores e alunos, à despeito das demais condições que influem no processo de ensino-aprendizagem.
A aplicação da meritocracia revela um modelo de educação mais preocupado com os resultados (quantidade) do que com o processo (qualidade) e uma despreocupação com um plano de carreira, cargos e salários para os professores da rede pública. Esse sistema poderá levar as escolas a concorrerem entre si, reforçando as diferenças entre elas, já que lidam com realidades distintas.
Provavelmente os professores procurarão transferir-se para as escolas mais bem colocadas nas avaliações, com o objetivo de obter maiores chances de bônus. Gerará também concorrência entre os professores, isolamento da categoria e fragmentação do movimento dos trabalhadores.
Há ainda o grave risco de os professores passarem a ensinar aos seus alunos os macetes para saírem bem nos testes, substituindo a preocupação com uma formação integral e consistente em todas as áreas do conhecimento. O risco é reduzir o currículo a habilidades básicas e a associação à recompensa e punições através das avaliações em detrimento da formação integral dos educandos.
É fundamental que os trabalhadores da educação, os alunos e os pais
tenham maior clareza das consequências da adoção da meritocracia como
critério para pagamento de bônus para professores da rede pública para
que possam defender seus direitos em defesa de uma educação de
qualidade.
Ivana Veraldo
Professora-doutora do Departamento de Fundamentos
da Educação da Universidade Estadual de Maringá (UEM).
http://www.odiario.com/opiniao/noticia/584157/meritocracia-na-educacao/