A apresentação se deu na defesa de dissertação da primeira mestra travesti formada pela UEM. Veja as fotos na galeria
Lua Lamberti de Abreu, primeira travesti formada como mestra na Universidade Estadual de Maringá, esteve no estúdio da UEM FM onde concedeu uma entrevista ao jornalista Marcelo Henrique Galdioli na manhã desta quarta-feira, dia 27. Na sequência falou do seu trabalho na redação da Assessoria de Comunicação Social da Universidade. Aliás, desde que defendeu a dissertação de mestrado, pelo Programa de Pós-Graduação em Educação, Lua ganhou visibilidade na mídia e foi procurada por vários veículos de comunicação.
Para ela esse movimento é bom e se coaduna com sua pesquisa de mestrado que questiona exatamente o apagamento da arte transformista nos espaços formais. Neste sentido, falar do trabalho é dar voz a uma arte marginal, que é pouco vista e pouco valorizada socialmente.
“É verdade que as pessoas trans não são bem-vindas em espaços educacionais. O fato de eu ser a primeira a defender um trabalho de mestrado na UEM já ilustra isso”, pontua Lua. Pior do que não ser vista é ter de enfrentar a homofobia que por vezes é manifestada com violência. “Se preciso sair vestida como Drag vou sempre de carro porque se andar pelas ruas corro o risco de ser agredida”, diz.
O debate sobre o apagamento da arte transformista já havia sido levantado por ela em 2016 no trabalho de conclusão de curso na graduação em Artes Cênicas da UEM. Mas as dimensões daquela pesquisa eram bem mais modestas. No mestrado Lua teve a chance de ampliar a discussão.
“Fiz muitas escolhas arriscadas”, revela, destacando que usou uma estrutura caótica. Pelo viés das artes cênicas, Lua lançou mão da liberdade poética inclusive para subverter normas, ainda que permanecendo dentro de parâmetros aceitáveis pela academia. Nesse sentido, teve o respaldo da Epistemologia Feminista nas narrativas. E utilizando o recurso metodológico da autoficção, trouxe em cena sua persona Drag, a Galathea X que traçou um mapa de referências artísticas, midiáticas, literárias, científicas ou acadêmicas e através delas vai contando histórias e vivências.
Em uma apresentação performática, Galathea problematizou as funções e relações das artistas transformistas, evidenciou a invisibilidade e inacessibilidade de pessoas trans aos espaços de produção de saberes e traçou um paralelo com a violência sofrida por esta população.
Com estes ingredientes, a pesquisadora optou por abordar um movimento pedagógico que é sentido nos grupos, nas famílias, nos agrupamentos de pessoas trans. Assim, na condição de sujeito e não objeto da pesquisa, nos levou a conhecer e entender tais experiências marginais como possibilidade de forjar territórios educacionais mais receptivos e acolhedores para pessoas trans como ela. A este movimento, Lua deu o nome de “Pe-Drag-Ogia”.
“É pensar em formas inventivas de fazer uma pedagogia que seja convidativa e não violenta, que seja plural e respeite as diferenças”, resume.
Lua destaca que seu trabalho é resultado de incontáveis mãos, a começar pelas orientadoras, as professoras Eliane Maio e Roberta Stubs Parpinelli. “Minha lista de agradecimento ocupou duas páginas. Sem citar diretamente nomes tentei mostrar que em torno da minha pesquisa se formou uma constelação afetiva na qual brilharam muitas estrelas”, comenta.
O resultado final e a avaliação positiva do seu trabalho foi surpreendente, segundo ela. “No início da pesquisa passei por uma banca de qualificação na qual fui muito criticada o que me levou a praticamente recomeçar todo o texto”, conta Lua. A experiência negativa gerou, segundo ela, uma certa tensão quanto à avaliação da banca. Ela destaca que entre as avaliadoras estava Meg Rayara Gomes de Oliveira, a primeira travesti negra a obter o título de doutora na Universidade Federal do Paraná.
Além das orientadoras e da professora da UFPR, a banca contou com a participação da professora Cássia Cristina Furlan, da Universidade Federal da Grande Dourados.
Sobre o futuro, Lua Lamberti diz que cursar um doutorado é uma aspiração, mas que no momento está envolvida com a continuidade de alguns projetos teatrais.