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Os triatomíneos, conhecidos como barbeiros, foram capturados em 40% dos municípios do Paraná

Resultados de uma pesquisa desenvolvida pela UEM em parceria com a Universidade Estadual Paulista (Unesp), câmpus de Rio Claro, prevendo a distribuição potencial de insetos vetores do Trypanosoma cruzi, parasito causador da doença de Chagas, mostrando áreas potenciais de alto risco para transmissão vetorial da infecção, foram publicados na PLOS Neglected Tropical Diseases, uma das mais prestigiadas revistas do mundo sobre doenças tropicais negligenciadas. 

Pela UEM, o trabalho envolveu o Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde (PCS) e pela Unesp de Rio Claro contou com a participação de pesquisadores do Laboratório de Ecologia Espacial e Conservação (LEEC).

A pesquisa foi liderada pelo professor Max Jean de Ornelas Toledo (foto abaixo), do Departamento de Ciências Básicas da Saúde (DBS), da UEM. Max é doutor em Parasitologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com pós-doutorado em Biologia Parasitária pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC), no Rio de Janeiro. 

Max

Segundo o professor, a ideia de desenvolver esta pesquisa surgiu inicialmente durante a oferta de uma disciplina do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde, da UEM, cujos professores, que tinham experiência em estatística espacial, apresentaram a sugestão para alguns pós-graduandos que trabalhavam com doença de Chagas. "A pesquisa passou a fazer parte da dissertação da aluna Andreia Mantovani Ferro e Silva (foto abaixo), matriculada na disciplina e recentemente mestre em Ciências da Saúde pela UEM sob minha orientação”, afirma Toledo.

Os pesquisadores do LEEC/Unesp, liderados pelo professor Milton Ribeiro, foram contatados e passaram a integrar o projeto. Estes pesquisadores possuem grande experiência em modelagem de nicho ecológico (MNE).

 Andreia Mantovani 5A

 Método

 Este método para avaliar os padrões de distribuição de populações usa o conhecimento da distribuição atual das espécies com base nas ocorrências conhecidas, juntamente com variáveis ambientais e algoritmos matemáticos, visando a deduzir localidades adequadas para a ocorrência de espécies em locais onde não se sabe da ocorrência. 

Ao mesmo tempo em que é amplamente utilizado para prever a distribuição potencial de espécies, o método, por conseqüência, antecipa os padrões geográficos de risco de transmissão de doenças.

O Paraná cobre 2,5% da área do Brasil e abriga extensas áreas florestais que pertencem ao Cerrado e principalmente à Mata Atlântica. "Nossos resultados mostram que municípios das regiões noroeste, norte e nordeste do Estado, apresentaram elevada adequabilidade climática e de paisagem para a ocorrência de triatomíneos, áreas originalmente inseridas na Floresta Estacional Semidecidual", diz Toledo. 

De acordo com o professor da UEM, neste tipo florestal ocorre grandes variações sazonais de temperatura. "Ele é caracterizado por dois períodos de influência climática (chuvoso e seco). Suas árvores perdem parcialmente as folhas e abriga uma rica biodiversidade. Os resultados deste estudo podem ser utilizados também para atualizar a lista de espécies de triatomíneos capturados nos últimos anos no Paraná, onde foram registradas cinco espécies, embora apresente mais de 97% de sua área territorial inserida em um único bioma, a Mata Atlântica", esclarece.

O registro de um total de 2.662 triatomíneos, que foram obtidos com a ajuda de membros da comunidade durante o período de 2007 a 2013, foi repassado aos professores envolvidos na pesquisa pela Secretaria Estadual de Saúde. 

A espécie com o maior número de exemplares foi Panstrongylus megistus (73%), seguida por Panstrongylus geniculatus (15,4%), Rhodnius neglectus (6%), Triatoma sordida (4,5%) e Rhodnius prolixus (1,1%). Deste total, 72% foi capturado dentro das residências e 20% dos 2.472 insetos examinados estavam infectados com T. cruzi. A foto que abre este texto mostra os locais, marcados com pontos vermelhos, onde foram encontrados a espécie Panstrongylus megistus no mapa do Estado.

Os triatomíneos foram capturados em cerca de 40% (159 de 399) dos municípios do Paraná. Desses, os com maior número de triatomíneos capturados foram Guamiranga (6,3%), Rosário do Ivaí (5,6%), Querência do Norte (4,4%), Santana do Itararé (4,3%) e Nova Londrina (3,5%). Veja, na foto abaixo, as cinco espécies citadas acima, as mais localizadas durante a pesquisa.

barbeiros

Modelos de nicho ecológico foram gerados com base em variáveis climáticas e de paisagem e foram utilizados para classificar os municípios quanto ao risco de ocorrência de triatomíneos sinantrópicos. 

A análise integrada da adequabilidade do clima e da paisagem na distribuição geográfica dos triatomíneos foi poderosa na geração de bons modelos preditivos, mostrando que alguns municípios do estado têm um maior risco de transmissão de Trypanosoma cruzi pelo vetor. Dos 399 municípios do Paraná, 26% foram classificados como tendo alta adequabilidade climática e de paisagem, e apenas 4% (16) apresentaram baixa adequabilidade climática e de paisagem para a ocorrência dos vetores.

 Novas possibilidades

“Estes resultados permitem predizer o perfil dos municípios em que há alto risco potencial de transmissão de T. cruzi pelo vetor, sem a necessidade de amostrar/capturar os insetos focalmente”, informa o professor Toledo. 

Ainda segundo o pesquisador, essas previsões geraram conhecimento ecológico e biogeográfico sobre triatomíneos, fornecendo informações para subsidiar os serviços de saúde, orientando as ações de controle e prevenção da doença de Chagas no Estado do Paraná. 

"Embora os resultados predissessem um potencial risco espacial confiável para T. cruzi, existem algumas limitações no estudo. O uso de dados agrupados de múltiplas espécies vetoras e a premissa de que a coleta de dados de ocorrência de espécies vetoras é plausível (se os insetos estavam infectados ou não, e se eles foram encontrados em ambientes fechados ou não), deve ser revisada para melhorar a previsão do risco de aquisição de T. cruzi", explica ele. 

“A frequente invasão de casas por triatomíneos infectados indica claramente um maior risco de transmissão de T. cruzi aos moradores. Mais atenção à saúde pública deve ser dada nas áreas do norte do Estado do Paraná. Em suma, nossos resultados, por meio de análise espacial e mapas preditivos, mostraram-se eficazes em identificar áreas de distribuição potencial e, consequentemente, na definição de ações estratégicas para prevenir novos casos de doença de Chagas, reforçando necessidade de vigilância contínua e robusta nessas áreas”, conclui Toledo.

equipe

O estudo contou com financiamento da Fundação Araucária para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Para saber mais, acesse o endereço eletrônico. Na foto acima, membros da equipe do Laboratório de doença de Chagas da UEM.

 Invasão freqüente

 O Trypanosoma cruzi, causador da doença de Chagas, atinge seres humanos, insetos triatomíneos (barbeiros) e mamíferos domésticos e silvestres. A invasão de moradias humanas por esses insetos infectados é frequente e representam um alto risco de transmissão vetorial de T. cruzi para os humanos. 

Estima-se que existam cerca de 12 milhões de portadores da doença crônica nas Américas, cerca de 2 a 3 milhões no Brasil. Doenças negligenciadas, como é o caso da doença de Chagas, são aquelas causadas por agentes infecciosos ou parasitas e são consideradas endêmicas em populações de baixa renda. 

Essas enfermidades também apresentam indicadores inaceitáveis e investimentos reduzidos em pesquisas, produção de medicamentos e em seu controle. Elas incapacitam ou matam milhões de pessoas e representam uma necessidade médica importante que permanece não atendida.