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Enquanto aguarda a possibilidade de validação do diploma de médico, o sírio Ali Hamed (31 anos) trabalha como motorista

A UEM (Universidade Estadual de Maringá) realiza, nesta sexta-feira (17), no auditório do Bloco B-33, o I Encontro Nacional de Políticas de Apoio aos Imigrantes na Universidade. O evento colocará em discussão as políticas públicas para inclusão de imigrantes na Universidade e abrirá o debate para a implementação do Programa de Inclusão de Refugiados e Imigrantes em situação de Vulnerabilidade na UEM.

A solenidade de abertura do evento será às 8h30 e logo em seguida começa a mesa-redonda Política de Inclusão dos Imigrantes na UEM: contexto e desafios. O debate terá a participação do coordenador geral de Assuntos Internacionais da Educação Superior (MEC), Norai Romeu Rocco, da coordenadora de Acompanhamento Acadêmico para Estudante Refugiado, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Thais Juliana Palomino, e dos professores Ricardo Gardiolo, do Departamento de Direito da UEM, e Sueli de Castro Gomes, do Departamento de Geografia da UEM. O evento segue à tarde, com Grupos de Trabalho.

A presença de refugiados no Brasil em busca de estudo é algo comum em diferentes regiões do país. Além das representantes de instituições que estarão presentes no evento da UEM, outras universidades federais também reservam parte de suas vagas para imigrantes e refugiados. Os vestibulares especiais e programas de permanência universitária são formas de inserção social que estão dando resultado.

Na UEM

Professores de diversas áreas do conhecimento mantêm na UEM a Comissão de Resolução de Revalidação de Diplomas (CRRD). Por meio de projetos de extensão e com a colaboração de ONG’s de Maringá, eles  dão apoio jurídico e aulas de língua portuguesa a refugiados e migrantes. De acordo com o professor do Departamento de Direito Público (DPP) e também membro da Comissão, Ricardo Gardiolo, uma resolução do Ministério da Educação (MEC) prevê a desburocratização para o reconhecimento de diploma de estrangeiros no país.

A abertura permite que instituições de ensino superior brasileiras regulamentem normas especiais nos respectivos Conselhos e Colegiados Superiores. “Na Europa existem sistemas de portabilidade de diploma bastante eficientes. As avaliações existentes na UEM inviabilizam a revalidação de diplomas, não há como fazer um checklist de ementas e disciplinas”, justifica Gardiolo.

Com base na lei de Migração Brasileira, lei do Refugiado, e na Declaração Universal dos Direitos Humanos, os organizadores deste primeiro encontro propõem uma análise do que já existe e do que pode ser adequado para receber estrangeiros refugiados na instituição. Atualmente a Universidade não dispõe de  ferramenta jurídica ou de normas que garantam o acesso de imigrantes refugiados a vida estudantil interrompida no país de origem.

Segundo a coordenadora do evento, a professora do Departamento de Geografia (DGE), Sueli Castro Gomes, uma das propostas que será apresentadas é a possibilidade de disponibilizar parte das vagas remanescentes para imigrantes. “Isso derrubaria a argumentação de que estrangeiros estariam tirando vagas de brasileiros”, esclarece Gomes.

Membros da Comissão sobre o assunto, na UEM, ainda defendem que o acesso dos estrangeiros em situação de vulnerabilidade à universidade resultaria em enriquecimento cultural e científico, uma vez que, depois de matriculados, poderiam atuar em monitorias de diversas áreas do conhecimento. A portabilidade do diploma, por exemplo, inibiria a exploração de trabalho dessa população. 

Sobre o acolhimento aos imigrantes e refugiados na universidade, o vice-reitor, Julio Damasceno, observa que, em razão da representatividade socieconômica da UEM nas regiões onde ela está inserida, os estrangeiros tendem a pedir apoio na Instituição. “Não dá para fechar os olhos para esta parcela da população que cresce a cada dia. A universidade deve estar preparada para atender essa necessidade, para isso são necessárias discussões mais amplas no meio acadêmico”, destaca Damasceno. Na análise do vice-reitor, o conhecimento de profissionais estrangeiros pode contribuir com o crescimento da economia regional.   

Imigrantes e refugiados

Informações divulgadas pelo Conselho Nacional de Imigração (CNIg) revelam que 82% do total de imigrantes no Brasil são solicitantes de refúgio, geralmente com bom nível de escolaridade (32% com superior completo ou pós-graduação). Um fato alarmante é que a maioria diz ter enfrentado situações de xenofobia.

A ausência de normas que incentivam a legalidade de imigrantes e refugiados por muitas instituições tem levado-os a prática de outras atividades para sobreviver, é o caso do sírio Ali Hamed, de 31 anos. Para se manter, atualmente o imigrante atua como motorista de aplicativo. Cardiologista pela Universidade Federal de Medicina da cidade de Kursk, na Rússia, desde que chegou a Maringá, há pouco mais de um ano, o refugiado sonha com a revalidação do diploma para atuar como médico. “O processo é muito burocrático, principalmente em função do idioma. O imigrante precisa de dois anos, no mínimo, para ter fluência e o tempo gasto poderia ser aplicado na atividade”, desabafa o sírio.

A comunidade de imigrantes em maior número na região Noroeste é proviniente do Haiti. De acordo com o líder da Associação dos Haitianos de Maringá, há muitos refugiados que acabam submetendo-se a condições precárias de trabalho por não haver formas mais simplificadas de comprovação de documentos, tanto para refugiados que possuem formação, quanto os que desejam continuar os estudos.

Para o presidente da Associação de Estrangeiros da Região Metropolitana de Maringá, o venezuelano Erik Perez, a realização do I Encontro de Políticas de Apoio aos Imigrantes na UEM traz mais otimismo para aqueles que aterrissaram em solo brasileiro em busca de uma vida mais digna. “O imigrante não sabe como ele é percebido pela sociedade local e este tipo de evento é uma forma de expormos nossas necessidades e mostrar como podemos colaborar com o bem estar da população”, argumenta.

Estatísticas

De acordo com dados das Organizações das Nações Unidas (ONU), aproximadamente 15 milhões de pessoas se encaixam na definição de refugiados. São aquelas que saem do país de origem por perseguição, guerra ou desastre natural.

No Brasil, os países que mais solicitaram refúgio, até 2016, foram Venezuela, Cuba, Angola, Haiti e Síria. Mesmo com a divulgação de números oficiais sobre solicitações de refúgio e regularização da permanência no Brasil, estima-se que a quantidade de refugiados e imigrantes seja muito maior, já que muitos vivem na ilegalidade devido à burocracia e altos custos dos processos para se regularizar.

No próximo dia 21, entrará em vigor uma nova lei sobre imigração no Brasil. O Ministério Público Federal informou que  deverá ter acesso ao texto base que está sendo preparado pelo governo, e que possivelmente será organizada uma consulta pública com a participação do Comitê Nacional para Refugiados (Conare) e do Conselho Nacional de Imigração (CNIg).